Kaenge

AVENTURAS DE INFÂNCIA

Isto só poderia acontecer comigo.

Este é mais um acontecimento dos bons velhos tempos de tenra infância.
Não me lembro ao certo que idade teria. Só me lembro que tinha a bicicleta ainda há muito pouco tempo, prenda que o meu pai me ofereceu por ter passado com distinção na minha quarta classe tirada em Sá da Bandeira, onde estive como hóspede na casa do professor Portugal, na Escola Primária Luís de Camões, onde o professor Portugal era o Director e meu professor também, homem muito conhecido na cidade por ser um dos melhores professores , muito exigente para com seus alunos. Quando o meu pai me foi buscar, teve uma reunião na sala de visitas da sua residência onde foi recebido pelo professor e esposa. Lembro-me que eu, a Ângela e o irmão mais novo,(filhos mais novos do professor), curiosos por saber qual o tema da conversa, escutávamos, escondidos no hall da entrada. Ouvi então o professor Portugal tecer grandes elogios à minha pessoa, como tendo sido o melhor aluno que teve e que tinha muita pena de não me ter mais como hóspede na sua casa. Claro que o meu pai ficou comovido com a conversa e na viagem de regresso a Nova Lisboa, prometeu comprar uma bicicleta como prémio e foi com ela que me meti nesta viagem que não me esquecerei jamais.
Lembro-me que era uma sexta-feira, disse à minha mãe que ia com mais um amigo ao Kaenge,( o que não era verdade, caso contrário não me deixaria ir), passar o fim de semana com o Eduardo e família e depois do almoço, lá me pus a caminho. Levava apenas uns remendos para no caso de ter um furo, remendar a câmara de ar e pronto.
Conhecia a estrada de cor e salteado, só que a distância ainda era muito grande e o receio de me cansar e não chegar, creio que me deram forças para conseguir o intento. Tinha que atravessar ou melhor, subir o morro do Kussava, que se situava numa fazenda que era do meu pai e depois do qual, na descida, começava a fazenda do Alemão, local onde o Sr. Eduardo costumava parar, quando ia com ele ao Kaenge, para apanharmos cogumelos, que eram tão grandes que se tinham que colher com cuidado porque se partiam aos bocados. O Sr. Eduardo é que era o especialista e sabia quais os que se podiam comer e os que eram venenosos.
Continuando......lembro-me de na subida do Kussava, ter de parar um pouco descer da bicicleta e levá-la pela mão uma boa distância. A partir dai, já não havia grandes subidas. Sempre ansioso por chegar ao destino, umas vezes mais depressa, outras mais devagar e após umas horas de andamento, lá consegui chegar para espanto de todos, foi uma festa, porque fui recebido com alegria por aqueles grandes amigos.
Naquele tempo, em que todos os angolanos eram irmãos, independentemente da cor, como bom seria se isso fosse possível nos tempos de hoje!!!!!!!.
Também era consciente que se algo me acontecesse, poderia, inclusive, dormir numa qualquer cubata, como se de minha casa se tratasse.

Quanto ao regresso, sinceramente já não me recordo como foi.

Como se diz agora, varreu-se-me.