UMAS GRAMAS A MAIS

Quando era mais novo tinha o vício pela caça, e como tantas vezes aos fins de semana lá ia eu normalmente com o mesmo grupo formado por amigos com os quais tinha absoluta confiança.
Uma vez com uns, outra com outros,mas eram geralmente os mesmos.

Certa vez calhou ir com um casal amigo e qual o meu espanto, na hora do encontro apareceu um homem que eu apenas conhecia de vista e que era amigo do dito casal,conhecido no burgo pela alcunha do "CASTANHOLAS" bem, depois das apresentações lá partimos.

Chegados ao local marcado para a caça que por sinal eram terras do meu pai, deixamos os carros numa picada e avançamos pelo mato adentro. Combinamos que seguiria-mos e andaria- mos em fila, primeiro meu amigo, depois a esposa, eu e o outro amigo, distanciados uns dos outros uns 20 metros mais ou menos. Sinceramente não gostei muito logo desde início do comportamento do convidado, pareceu-me muito excitado, disparava para tudo quanto mexia sem saber ao certo o que era, talvez para mostrar aos amigos que era bom atirador e queria demonstrar que era o mais rápido no gatilho e pontaria.
Após termos andado uns bons quilómetros , termos dados uns tiritos e caçado algumas perdizes, senti não uma dor, mas sim algo quente na perna esquerda após ter ouvido um disparo. Como tinha e tenho um certo horror a cobras, pensei logo nisso e dei um salto para ver o que era e ao olhar para a perna apenas vi as calças todas furadas da altura do tornozelo até quase ao joelho, e desses furinhos jorrava sangue em abundância. Atónito com o facto, só me apercebi que tinha sido atingido por um tiro quando vejo todos a correr na minha direcção, apenas o caçador (o Castanholas) se mantinha onde estava e me olhava desconcertado sem saber o que fazer.

Claro tinha sido ele o causador do acidente, entre mim e ele saiu a correr uma cabra do mato (bambi) e ele com a pressa não deu tempo a que ela passasse pela nossa linha, disparou de imediato e claro aquela distância atingiu a peça de caça quando ela formou o salto e os restantes bagos de chumbo que passaram por baixo atingiram-me na perna.

Entrou tudo em pânico e discutiam com o Castanholas, ele com o medo com que estava, sem saber o que fazer e qual seria a minha reacção, atirou a arma para o chão e dirigiu-se a mim pedindo-me mil desculpas. Com tudo isto passaram uns bons minutos e foi então que comecei a ter dores. Tentei dar uns passos na direcção onde tínhamos deixado os carros mas apenas fazia com que das feridas saísse mais sangue. Resolveram então os dois homens ir ao encontro dos carros e trazê-los para o mais perto possível do local onde nos encontrávamos, ficando eu e a minha amiga à espera que chegassem. Apoiado nela ainda andei talvez quase um quilómetro até chegar ao local onde nos encontramos. As dores não eram muitas, apenas o receio porque não sabia o que fariam com a minha perna no Hospital.

Chegados ao Hospital , depois de tratado pelo médico de serviço que me tranquilizou, dizendo-me que não era nada grave e que após o tratamento em casa voltaria a caçar, fiquei mais descansado. Levei logo ali duas injecções e estive em casa cerca de sete dias com a perna mais alta do que a cabeça, findos os quais estava pronto para outra. E com isto, apenas mais um episódio de caça!!
A partir desse dia, continuo vivendo com cerca de 50/60 chumbos na perna esquerda e com umas gramas a mais até o resto dos meus dias. Só me lembro deles quando tomo banho, porque ao limpar a perna os sinto, bem quando me ajoelho.